Tinder ainda me é um mistério moderno. Tenho meus receios com ele, mas como a maior parte dos recém solteiros (ou dos convictos), já tive minha conta por lá. Já exclui, já recadastrei. Já a ativei no meio de uma viagem, só para checar o “mercado” e desativei em seguida, com preguiça do papo de entrevista que rola no chat.
O aplicativo me lembra muito aquelas revistinhas de perfumaria, que as meninas ainda deixam na cozinha do escritório, sabe? Aquela, que você folheia, folheia e compra uma coisinha ou nada. Pelo menos foi assim que funcionou para esta atrapalhada em questões do coração que vos fala.
Basicamente você expõe suas melhores fotos escolhidas criteriosamente, entre dezenas de selfies, de forma a deixar qualquer fulaninho com um “sex appeal” de estrela hollywoodiana. Se auto descreve em duas linhas (aqui cabem citações irreais da Clarisse Lispector, claro) e define limite de idade e quilometragem de busca. Prontinho, está novamente na pista, pronto para jogar e com riscos reduzidos. É como praticar Bungee Jump, mas sem a parte de pular de um penhasco amarrado numa corda.
Passa então a fazer parte um grande cardápio, onde a refeição mais sofisticada resume-se a um prato aquecido rapidamente no microondas. Tudo muito prático. Ele te poupa todo o incomodo de ter que ir para a rua, colocar um vestido, uma camisa limpa, perfume, flertar, retribuir sorriso, sentir as mãos suando enquanto tenta puxar assunto, lidar com a tensão de ser rejeitado e com a dor de um fora. O dano online é mínimo. Ninguém sofre e a rejeição é muda, afinal só é possível ter acesso a quem curtiu suas fotos, esperando com base na imagem, que você seja uma pessoa legal.
Não tem sedução, verdade. Mas é mais prático e objetivo, com certeza. Ou deveria ser. Não fosse um grupo bastante perdido e confuso tentando fazer uso dessa ferramenta: o bloco do coração partido, do crush não correspondido, do netflix com hambúrguer na sexta à noite, em casa, choramingando e com o smartphone na mão.
Esse grupo me passa a impressão de estar na rede social substituindo o combo maravilhoso para curar pé na bunda, que tem funcionado por gerações: comida gordurosa, amigos e porre. Tem muita gente, inclusive, confundindo o aplicativo com colo de mãe e coberta. Vamos organizar isso? Tinder não é para fazer passar dor de cotovelo, chorar pitangas no ombro alheio ou curar vazio que o outro deixou no seu dia. Isso somente você e o tempo podem resolver.
Ok, sejamos razoáveis, eu mesma já criei a conta sentada na mesa de um bar, enquanto revirava meus ais de mulher moderna, embebidos em cerveja de quinta e contos de fadas fodidos. Mas sério, na boa, por experiência própria, não rola. Só piora. Muito papo furado, trocas de telefone e encontros desastrosos depois, te fazem constatar isso.
Tinder é para gente bem resolvida, que está afim de curtir, sem neuras, sem crises de choro entre um match e outro, sem pote de sorvete e nariz escorrendo. Do contrário, esse vazio gelado deixado pelo filho da puta que partiu seu coração no meio do inverno, sem te deixar nem uma coberta, só aumenta. Ou seja, em casos de overdoses de sofrimento por amor, brigadeiro, pijama e filminho no escuro ainda funcionam melhor.
Sossega, o “app” vai continuar lá, te tentando, mas não tenha pressa, dá um tempo para si. Quando a ressaca moral e o calo no ego aliviarem, você pode usufruir de todos os benefícios, conseguir alguns encontros-merda, outros interessantes e, como aquele amigo de um conhecido meu conseguiu, quem sabe até consegue achar um amor para chamar de seu. Afinal, a gente só consegue achar um amor de verdade, quando não necessitamos dele pra ser feliz.