Depois de um ano frequentando um grupo de estudos de filosofia tântrica (de raiz mesmo, sem clichês sexuais) criei coragem para encarar um curso de massagem mesmo sendo jornalista e não terapeuta, como a maioria dos participantes. Curiosa de plantão, constantemente digo que fui eu quem abriu a caixa de pandora porque minha curiosidade sempre fala mais alto que o meu medo. Na hora de fechar o curso eu pensei que no pior das hipóteses minha experiência viraria mais um texto.
O que me atraiu foi a ideia de dessexualizar o corpo com a crença de que todas nossas memórias emocionais estão gravadas em nossa pele, nervos e células. Meu intuito era um autoconhecimento através da massagem, metodologia Tantralight nivel 1 do Ananda Prem (onde não há toque nos órgãos genitais, porém todas as massagens são recebidas no corpo desnudo). Se o corpo possui mais de 600 mil pontos sensíveis, seria possível eu estar nua diante de um homem usando técnicas de massagem e aquilo me terapeutizar sem rolar sexo algum? Seria possível toques corporais trazerem incômodos? Aquela experiência traria à tona memórias emocionais guardadas no fundo do meu baú? Este campo sempre me intrigou.
Lá fui eu encarar mais uma aventura com os ombros travados e uma enxaqueca bombando. O professor já havia alertado que “um exército de sabotadores” sempre se encarregam de nos sacanear criando sintomas psicossomáticos vésperas de experiências assim. Não fugi à regra. Logo que começaram os exercícios de relaxamento minhas dores todas desapareceram, como o professor também havia anteriormente garantido.
Antes de ir para as técnicas de massagem, aprendemos sobre todas as vertentes do Tantra, a origem da massagem (que nada tem a ver com a Índia, mas sim com um alemão que desenvolveu as primeiras técnicas), exercícios de respiração, meditação, relaxamento da mente e consciência do próprio corpo físico. A cada exercício todos iam relaxando mais e a cada nova técnica de massagem também nos despíamos mais. Assim, em doses homeopáticas, foi passando meu medo de ficar nua com mais 27 peladões. Lá descobri que a depilação masculina está em alta e eu nem sabia (e muito menos gosto). Conversando com uma amiga, chegamos à conclusão que esta moda deve ser por causa dos filmes pornôs, afinal a ausência de pêlos faz o pênis parecer maior. Quanto a depilação feminina, aparentemente, a maioria das mulheres tiram todos os pelos. Mas assim não fica uma vagina infantil?
No final do primeiro dia, quando finalmente aplicaríamos todas as técnicas aprendidas na parte de trás do corpo, fui ao banheiro antes do exercício. Quando voltei à sala, enrolada na toalha, tive a certeza de que aquela experiência viraria um texto: 15 matts de yoga ocupados por homens nus deitados de barriga para baixo. Eu nunca tinha visto tantas bundas masculinas concentradas em um só lugar. Fiquei estática e o professor me perguntou:
– Já tem seu par? – e eu
– Não! Como escolho? – ainda chocada e paralisada
– Na vida não há regras para essas coisas. Escolha logo um porque já vai começar.
Saí andando meio bêbada pela situação e no primeiro que tropecei, eu sentei e fiz a massagem. Depois trocamos e ele fez em mim, mesmo sem eu saber seu nome. Era tudo tão chocante que não senti nada. Estava anestesiada pela situação e apenas me concentrei na minha respiração.
Ao sair de lá, depois de 9 horas de curso, eu mal sabia onde morava. Estava exausta e não conseguia pensar em nada. Mesmo assim, pedi para um amigo me levar para a porta do Espaço das Américas porque eu precisava vender meu ingresso para o show do Lulu Santos. Eu não tinha condição nenhuma de ir ao show, leia-se: certamente eu esqueceria as letras das músicas que sempre cantei nos karaokês.
No segundo dia o bicho pegou. Uma vivência de renascimento mexeu com as estruturas emocionais de todos. Vendados se trombando, ouvia-se choros, risos, gemidos… Não podíamos falar e era expressamente proibido “qualquer tipo de introdução” (deduzi que o condutor se referia a línguas, dedos e genitais). Podíamos apenas tocar o outro se a energia fluísse e se tivéssemos vontade. Foi interessante perceber os diferentes toques vindos de mulheres e homens, assim como eu me permiti tocar em quem eu sentisse vontade também. Lá, vendada, foi claramente perceptível a sutileza entre o toque do carinho e o toque com intenção sexual. Algumas pessoas me davam vontade de abraçar e chorar, outras, no entanto, eu só quis ficar de mãos dadas.
No último exercício, onde recebi 40 minutos de massagem com todas as técnicas aprendidas e em seguida também apliquei, consegui notar a minha entrega. Nesta altura, a minha depilação falhada e a barriga inchada já não tinham importância alguma. O medo de me sentir provocada em algum toque também era inexistente. Descobri um novo prazer que até então eu desconhecia: tocar o corpo de um homem com carinho e entrega sem necessariamente desejá-lo, assim como, relaxar completamente entregue ao toque de um homem sem necessariamente ele querer transar comigo. Ao longo das trocas de massagens tive muitos insights e memórias que vieram à tona. É indescritível a viagem interna que vivi.
Na volta para a casa, fui parar a 17 kilômetros depois de onde eu moro. Quando finalmente cheguei no meu prédio, ao sair do carro, percebi que estacionei formando um triângulo de 90 graus com a calçada. Comecei a gargalhar no meio da rua, pensando: o pior é que se uma blitz me parasse eu não seria presa. Dirigir depois de duas taças de vinho é fácil, mas depois de 18 horas de curso de massagem tântrica é para poucos.