Não, eu não te deixei entrar. Foi apenas uma visita de cortesia. Eu abri a porta, não a vida.
Não que eu não goste de você, só não gosto de muitas perguntas. Gosto das suas canções, mas ainda prefiro o meu silêncio. Gosto de suas visitas, desde que não mexa nos meus livros ou pergunte sobre as manchas no meu tapete. Só preciso de muito espaço e poucas certezas.
Podemos tomar um drink, ver um filme, planejar nossa ida a um show próximo e até passear no parque romanticamente, como naquelas comédias românticas que eu não assisto há séculos, mas eu não quero vê-lo saindo do banheiro enrolado na minha toalha.
Não pense que é por frieza, não me veja como um poço escuro de arrogância. É que o excesso de intimidade já me roubou de mim um dia. Já me senti um pedaço vivo de outra pessoa, já preparei o jantar, já senti um abraço tão intenso e tão puro que jamais acreditei que pudesse viver sem (nota: eu sobrevivi).
Já incluí outro rosto em todas as minhas fotografias, já amei tão intensamente que mal podia respirar. Isso me tirou o sono, os talentos, a individualidade e a paz.
Agora, tudo está fechado, hermeticamente, e essa é uma escolha minha – a única que me parece certa, na verdade. Agora, sou tão minha que não consigo ser tua, nem por um segundo.
Algum dia, alguém conseguirá transpor a minha barreira de insegurança crônica, alguém virá e me mostrará que é possível dividir a vida com outra pessoa sem se perder de si mesmo, mas receio que este alguém não seja você.
Em algum momento eu vou conseguir abrir a porta, a vida e o coração, mas não agora. Por enquanto, continuo guardando só pra mim os meus medos, as minhas dores, as minhas paixões e as minhas verdades.
Não se sinta ferido no ego, não é pessoal. Você é incrível como eu pensei. Talvez um pouco mais, confesso. Seu riso é natural e seu abraço me faz sentir que nada de ruim pode me atingir – e é exatamente por isso que eu não me deixo demorar em ti. A cada pedaço teu que fica aqui, um outro pedaço meu vai embora. Você é sensacional, mas eu sou louca o suficiente pra te dispensar.
“E a minha loucura é sagrada. Não me toque.”