• Que a vida adulta não lhe tire  a capacidade de sonhar
  • Que a vida adulta não lhe tire


    a capacidade de sonhar


    A criança que eu fui sonhava em ser escritora. “Vou fazer faculdade de letras e escrever livros que nem Monteiro Lobato”, eu dizia. Quando não estava ocupada rabiscando meus diários ou caderninhos de poesia preenchidos por uma caligrafia torta e infantil, estava às voltas com a minha flauta de plástico e uma escova de cabelos que, na minha fertilíssima imaginação, era claramente um microfone.

    “Mãe, eu vou ser cantora que nem Eliana.”

    Meus pais sorriam, contentes, mas sabiam que a vida adulta me acordaria. Aos dezesseis, resolvi fazer faculdade de direito, mesmo sabendo que isso não me tornaria uma escritora de sucesso ou a próxima Eliana. Decidi porque era conveniente: a Universidade fica perto da minha casa, eu tenho facilidade com interpretação de textos, advogados ganham bem e têm algum prestígio social, meus pais se orgulharão de mim.

    Tentei, impiedosamente, matar os meus sonhos. Eu não sabia por onde começar pra ser a próxima Eliana ou escrever livros como Monteiro Lobato, e, afinal, era preciso seguir. A ideia de que os meus sonhos deveriam bater à minha porta como num passe de mágica me arrebatava a coragem de buscá-los.

    Até que, num belo dia, eu resolvi tentar. Me matriculei numa escola de música e contactei pessoas para montarmos uma banda. Fiz uma seleção para um blog – por acaso, para este blog – e desenterrei os meus hobbys favoritos. E, veja só: eu não precisei abandonar a faculdade de direito. Eu não precisei abdicar da minha ‘realidade’ até compreender, completa e indubitavelmente, que eu nascera para obedecer aos anseios da minha alma.

    Hoje, sorrio bonito a cada nota, a cada vez em que entro num estúdio, a cada acorde que me me invade a alma e me faz, finalmente, sentir viva. Meu coração se enche de vontade de vida todas as vezes em que rabisco alguns versos ou sinto o cheiro do meu livro.

    E, não, eu não sou a próxima Eliana. Talvez eu jamais chegue lá. Eu não escrevo como o Monteiro Lobato. Mas eu faço dos meus dias aquilo que o meu coração sempre me pediu.

    Eu compreendi que os sonhos da minha alma infantil são os mesmos sonhos desta alma quase adulta, tão jovem, mas já cansada. A diferença é que a criança que eu era não se deixava abater por essa selva de pedras chamada realidade.As referências mudam, mas os sonhos permanecem intactos, no fundo de nossas almas, onde nos atrevemos a calá-los.

    Do mesmo modo, o seu sonho de ser bombeiro continua vivo em algum lugar. Em meio aos compromissos profissionais, às agendas lotadas e à odiosa obrigatoriedade de ser alguém na vida, ele se cala, sufocado. Em algum lugar do seu coração há a bailarina que você sonhava em ser aos três anos. Ou a mulher corajosa e destemida como a She ra.

    Ainda que a maturidade te ajude a compreender que nem tudo é possível – que não se pode voar ou ser uma ranger cor-de-rosa, por exemplo – ela não pode arrancar-lhe a única coisa que realmente vale a pena na vida que é sér alguém que nós mesmos admiraríamos.

    Nós negligenciamos os nossos sonhos infantis e nos esquecemos que eles – e apenas eles – estavam livres das amarras do possível. E que é cruel demais calá-los mesmo sabendo que só nos resta uma chance – o resto é incerteza.

    Torne-se um adulto que orgulharia a criança que você foi. Tolice é manter os pés no chão enquanto o que queremos, no fundo, é voar.

    ass-nathalie


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