50 anos depois, sentados na cadeira de balanço mirando todo o império que construímos diante de nós, o olhar amoroso dele para mim ainda era o mesmo. O abraço ainda era abrigo, as mãos dadas continuavam seguras, o sorriso permanecia um doce aconchego para a alma, mas havia um pequeno grande diferencial: a maturidade e o tempo em comunhão tinham tornado tudo muito melhor, e inexplicavelmente mais bonito.
Envelhecer ao lado de alguém é mais do que uma simples escolha, é uma dádiva. A cama nunca mais conheceria a solidão dos dias frios, a mesa sempre seria posta para dois, frente a frente que é para apreciar bem a travessia do outro depois de um árduo dia de trabalho, todas as noites os móveis da sala quase nunca utilizados receberiam visitas para o jantar, e o amor seria rotina. Uma singela, doce e agradável permanência.
Quando a gente escolhe passar o resto da vida com alguém, estamos enviando para o universo uma mensagem de fé. Colocamos nas mãos impetuosas do tempo a nossa estabilidade emocional, confiando que ele vai nos devolver todo o investimento em forma de sabedoria para aprender a sustentar uma relação a dois de verdade. E o tempo não falha.
A maturidade, a convivência, a toalha jogada em cima da cama todo santo dia, o domingo sagrado do futebol na TV, e a percepção de que algumas coisas são ínfimas e insignificantes num contexto geral para serem levadas tão a sério, desenvolvem “na marra” um lado da gente que costuma ser extremamente falho quando se é mais jovem: a paciência. Não é por menos, somos frutos de uma geração imediatista, parte integrante de uma sociedade que prefere um fast-food para alimentar a correria do dia a dia, ao invés de uma refeição saudável no restaurante que exige de você um pouco mais de tempo para saborear a refeição. Nas relações não seria diferente.
Acontece que boas histórias, aquelas com finais felizes, demandam eras de acertos e erros. Um dia a gente coloca uma pitada de discernimento, amanhã duas xícaras de tranquilidade, três anos depois finalmente entendemos que é preciso contar até 10 entre um argumento e outro durante uma briga, e 30 anos depois a nossa bagagem vai estar tão cheia de aprendizados saudáveis que a gente vai mesmo é querer viajar fundo no mundo de um alguém, só pra mostrar o tanto de coisa linda que a vida nos permitiu agregar. E acredite, você vai desejar dividir isso tudo com alguém que esteve lá, percorrendo cada ladrilho tortuoso do seu lado. Como eu disse lá em cima, amor é um ato de fé. Não existem garantias, botes salva-vidas ou máscaras de oxigênio. Nesta aventura só cabe você, ele(a), uma vontade enorme de ser feliz e o tempo.
Todas as vezes que eu vejo um casal de idosos em algum lugar sorrindo um para o outro sem dizerem nada, eu imagino que ambos estão proferindo em silêncio: obrigada por ter acredito em mim. Com o toque das mãos suave, o afago sem pressa, o olhar que se demora no semblante não mais tão jovial do outro, eles instintivamente endossam a minha história. É impossível não se deixar cativar pela sobriedade da maturidade para viver o amor. Mais bonito ainda é entender o caminho, os obstáculos e ter calma para chegar até lá.
Melhor do que ser uma pessoa mais completa, íntegra e realizada ao longo dos anos, é poder ser isso tudo ao lado de uma pessoa que respeita a nossa travessia, que nos quer bem, e que entende que a bagunça no banheiro depois do banho é um mero detalhe em um cotidiano tão recheado de cuidado. Viver é bom, namorar é ótimo, mas cair na gargalhada tentando refazer a posição 57 do Kama Sutra (que vocês eram ótimos por sinal) quando os joelhos já não respondem tão bem como nos tempos de outrora, deve ser absolutamente sensacional. Um turbilhão de sensações gostoso, desses que fazem a vida inteirinha valer a pena. É assim que as almas se reconhecem. É assim que se conhece o amor.