• Somos a geração do gozo na cueca
  • Somos a geração do gozo na cueca


    Como já devo ter dito a vocês, caros leitores, orgulho-me por ser um atencioso observador da espécie humana. Nunca – nem quando estou de folga ou completamente embriagado – deixo de me atentar às incontáveis modalidades de conduta do ser humano. Tento não deixar nada – nem um sorriso tímido – escapar. Presto atenção nas conversas da mesa de trás, confesso. Faço o possível para conseguir ler o que o cara da minha frente está digitando no celular, assumo. E sempre que vejo uma briga de casal, só para não perder uma possível pauta, finjo que preciso parar para amarrar os meus cadarços. Eu sou assim, ué, o que posso fazer? E graças ao meu olhar constantemente atento ao movimento da multidão e aos meus ouvidos sempre abertos ao papo dos desconhecidos, eu fui capaz de notar – nas avenidas da vida – um comportamento recorrente que, a meu ver, tem nos levado a diversas frustrações: a incapacidade de esperar o tempo necessário para a realização dos nossos objetivos.

    As pessoas têm agido, em diversas áreas da vida, como se tivessem acabado de descobrir que a Terra está prestes a ser atingida por um gigantesco meteoro. Tudo é urgente. Tudo é “pra ontem!”. Nada pode esperar o final do almoço. Os prazos já nascem estourados. E não estou falando apenas dos prazos que nos são empurrados por chefes carrascos, clientes insensíveis e por terceiros sem a mínima noção de humanidade. Refiro-me, principalmente, aos prazos que NÓS estabelecemos para o cumprimento de NOSSAS metas e missões. Prazos que criamos sem os pés no chão, e movidos por uma ansiedade que rói o nosso bom senso e turva a nossa paciência.

    E você por acaso sabe dizer um dos fatores que, certamente, contribui para nos colocar nesse constante estado de urgência? Eu tenho um chute: a nossa tentativa de viver, em tempo integral, com o “modo carpe diem” ativado. Como assim? Simples: esse imediatismo incontrolável é, claramente, um dos efeitos colaterais dos tantos discursos com a pegada “VIVA JÁ, ANTES QUE SEJA TARDE!” que a mídia (incluo-me nela) vive a propagar, com o intuito de incentivar as pessoas a aproveitarem, cada momento, como se fosse o último.

    Não discordo de quem diz que a fragilidade da existência e a constante iminência da morte são ótimos incentivos para que não nos acomodemos sobre o perigoso terreno do “e se”. Concordo, também, com aqueles que falam para não deixarmos para amanhã aquilo que pode ser feito hoje. Só acho que precisamos aprender a separar as “coisas que realmente podem – e precisam – ser realizadas já” das “coisas que exigem investimento de tempo para serem feitas”. Entende? A real probabilidade de você não estar viva no mês que vem não deve ser um incentivo para que você decida trocar a sua saúde por métodos que prometem coxas grossas em, no máximo, vinte e nove dias. Sacou?

    Nem tudo depende unicamente da nossa força de vontade ou apenas do nosso medo de morrer a qualquer momento. Certas coisas (como a faixa preta de uma arte marcial, a capacidade de tocar um instrumento ou uma barriga chapada) necessariamente levam tempo para serem conquistadas. Tempo que você precisa estar disposto a esperar – e investir – se realmente quiser chegar “lá”, onde quer seja o seu “lá”. E mesmo que não haja nenhuma garantia de que você viverá o suficiente para atingir o seu objetivo, não aceite atalhos desonestos que farão que com você, ao pousar direto no cume, diga apenas um desapontado “e daí?”.

    Se lhe oferecerem um bíceps de quarenta centímetros em apenas duas semanas, desconfie. Não acredite em fórmulas mágicas e em promessas que, indiretamente, chamam os esforçados de idiotas e os pacientes de ignorantes. E, por favor, não permita, de maneira alguma, que se aproveitem do seu imediatismo para encherem os bolsos de grana.

    Na maioria vezes, meu caro, a verdadeira graça da coisa está contida no ato de percorrer um doloroso e demorado percurso. E se, graças à alguma canalhice, você conseguir cortar caminho e pular diretamente à linha de chegada, imediatamente entenderá a frustração sobre a qual estou falando. De que vale o troféu se você não deixou o seu sangue e o seu suor estampados no tatame? De que adianta ser o autor do ponto final se você copiou o livro todo de outra pessoa, que varou madrugadas para escrevê-lo? Nada, respondo. Nada!

    Antes de reclamar e de dizer que não lhe ensinam nunca a fazer gol de bicicleta, aprenda primeiro a chutar a bola da maneira mais usual e eficiente. Antes de comprar a revista que promete tornar você apto a prover doze orgasmos seguidos à sua mulher, foque em conseguir fazê-la gozar uma vez por transa. Antes de querer ser “fodão” no sexo, aprenda a não se empolgar demais para acabar gozando na cueca.

    Para dizer que você ama alguém ou pedir perdão pelos seus erros, você não precisa esperar nem mais um segundo. Mas é necessário aceitar que, para cercas coisas, saber esperar é essencial. Fazer o que, né? Paciência e keep walking.

    O estilo de vida “carpe diem” é ótimo, desde que você saiba que, em muitos casos, nada substitui um dia após o outro.

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