Quem de nós está realmente preparado para os inevitáveis efeitos do tempo? Quem, sem o mínimo receio, está pronto para aceitar o que o passar dos dias certamente fará com a nossa pele e capacidade de memorização? Quase ninguém.
Eu sei que envelhecer é algo natural. Sei, também, que junto com os cabelos brancos eu ganharei experiência, maturidade e, com sorte, certo jogo de cintura. Mas a grande verdade é que caminhar rumo à morte é uma ideia que me causa tremores e pesadelos. Confesso: como trilhões de humanos que vivem tentando retardar – com cremes caros e agulhadas na cara – os efeitos corrosivos do tempo, eu também sinto um PUTA medo de perder. Perder o quê? Medo de perder os cabelos que, de acordo com a rápida vistoria que eu acabei de fazer em meu ralo, já estão partindo; medo de perder o fôlego que, apesar de ainda existir em meus pulmões e de continuar permitindo que eu faça gloriosas participações em peladas de domingo, já não é mais o mesmo da época do colégio; medo de perder o que eu tenho de mais valioso: a memória; medo de perder o controle do meu pau, e de ser obrigado a inserir uma dúzia de Viagras (espero que baste) na compra do mês – junto com duzentos gramas de suplemento de cálcio para os ossos, uma posta de atum para o coração e um litro de protetor solar para a careca vulnerável.
Eu juro que eu queria, com a mesma cara que faço quando eu vejo uma barata, dizer a vocês que velhice não me assusta e que acharei graça, apenas graça, quando as meninas do Leblon pararem de olhar para mim e começarem a me chamar de “tio”. Mas eu, caros leitores, estaria mentindo. Também estaria mentindo se dissesse que eu não tenho pavor de ficar ultrapassado e de, quando algum neto me contar o que fez no dia, não entender absolutamente nada. “O que é brincar de ‘Neoplasmon-xx’?”, eu certamente perguntarei – da mesma forma que o meu avô me pergunta coisas sobre o tal do Wi-Fi e sobre o funcionamento do sexo virtual.
“O tempo não para”, como bem cantou o Cazuza. E o que fazer, já que ele, o tempo, continuará nos corroendo até que reste apenas um resquício de nossos ossos e os frutos de nossos ofícios? O mais sensato, irmão, é gastar todas as suas energias aproveitando o tempo que você tem e evitar os esforços que você faz para tentar conseguir um tempo que nunca terá.
Devemos tomar muito cuidado com a nossa vontade – que beira a obsessão – de conseguir neutralizar os reflexos do tempo, pois, muitas vezes, vejo pessoas desperdiçando vidas inteiras enquanto tentam, desesperadamente e obviamente sem sucesso, encontrar a fórmula da existência eterna e da pele à prova de rugas. Algumas coisas não podem ser dribladas!
O que eu sei, amigos e amigas, é que, em certos aspectos, com a ajuda da medicina estética, dos exercícios físicos, dos superalimentos e de implantes capilares, podemos até dar uma tapeada nos indícios do tempo, mas sei, também, que gastar todas as nossos momentos procurando a juventude eterna é a maior das perdas de tempo; porque no fim, se você tiver tempo para notar que está partindo, perceberá que teria sido melhor se você tivesse investido o seu tempo em coisas mais interessantes, como cafunés em filhotes de porcos, cambalhotas em areais fofas e poesias recitadas sob o efeito de gás hélio.
Já que a vida certamente vai passar e que nada poderá fazer para que ela mude os planos, recomendo que você, ao menos, não a deixe passar em branco, e que pinte, com as tintas que tiver ao seu alcance, todos os segundos que separam o seu agora do seu “the end”.
O melhor que podemos fazer com o medo que temos do fim, certamente, é convertê-lo no maior dos motivos para que o nosso meio, enquanto durar, seja digno de virar uma daquelas biografias que fazem com que o leitor pule imediatamente da cama e sinta uma impostergável vontade de tragar cada segundinho da vida.
Meu medo dos ponteiros que nunca param, provavelmente, não passará. O mesmo talvez aconteça com você, caro leitor. E o que podemos fazer com esse pavor? Na melhor das hipóteses, podemos transformá-lo em um motivo incontestável para tomarmos mais sorvetes na casquinha, para vencermos mais vezes a preguiça congelante e para não perdermos nenhuma oportunidade de deixarmos o nosso coração, vestido de palavras, passear boca afora.
Que o nosso medo do tempo que rói a matéria, imediatamente, vire razão para não permitirmos que o nosso tempo – seja lá quanto tempo ainda nos resta – passe em vão e sem ser usado para a criação de boas lembranças.
Crédito Fotos: Carina Calixto