Não vou mentir. Tirar uma selfie num dia em que o seu cabelo está lindo, com aquele vestido que te deixou com curvas incríveis, pode render um ótimo momento que massageie o ego – por vezes necessitado de um elogio sincero e carinhoso. Assim como o meu Instagram possui fotos desse tipo, também mostra referências e gostos pessoais que são reflexos da minha personalidade e vida compartilhada com amigos e familiares.
Mas afinal de contas, se até o Obama que tirou uma foto no meio do funeral do Nelson Mandela (!!!) é adepto das selfies, uma ou duas fotinhos minhas na frente do espelho não podem fazer tanto mal, certo? Ou será que a gente consegue perceber de fato os exageros cometidos na forma como lidamos com a nossa própria imagem?
Em um destes programas matinais nos EUA, o ator-diretor-roteirista-galã-faz-tudo James Franco foi considerado o “Rei das fotos Selfie” por publicar fotos suas em diversas situações: seja dormindo com seus gatos ou participando do tapete vermelho do Oscar. Em defesa ao título, Franco escreveu um texto para o site do New York Times dando sua opinião sobre artistas que gostam de postar imagens de si próprios em suas timelines e perfis. O ator afirma que a nova onda se tornou a maneira mais popular de ser “amado” e de angariar likes e seguidores. “Eu percebo que fotos de projetos de arte e de poemas, por exemplo, não recebem tanta atenção e fazem até com que eu perca seguidores”, explica.
Atenção gera poder. A cultura da selfie oferece algo que poucos paparazzis podem dar: momentos íntimos das pessoas que admiramos, despertando a curiosidade de um público que tem a sensação de fazer parte da vida do ídolo de maneira full-time. As selfies das celebridades são formas de tornar figuras “inalcançáveis” ou “polêmicas” mais humanizadas, talvez originárias de uma sensação de mea-culpa ao provarem que não são apenas mais do que roupas ou corpos sarados.
Na fogueira das vaidades do ter e do aparentar de muitos, o que mantém o fogo aceso é ostentar e sustentar relações pouco profundas ou platônicas, onde trabalhos artísticos são considerados motivos de piada, ódio ou indiferença. Mas, gente, basta uma selfie significativa de uma miss bumbum wanna be com uma citação da Clarice Lispector ou do Caio Fernando Abreu para deixar tudo claro em nossas vidas, em pequenas cápsulas de sabedoria popular, não é mesmo?
Olhares e desejos por imagens belas e frases de efeito atraem e traduzem sentimentos, muitas vezes, editados e seletivos, com segundas intenções, em flashes manipulados. A ideia se baseia em: “Aqui está um pouco da minha vida privada. Em retorno, quero admiração e reconhecimento. Quanto mais eu posto, mais mantenho minhas relações” – uma moeda de troca ativa no mercado e era do amor virtual. Em contrapartida, para nós pobres mortais, distantes do universo das celebridades, quanto maior o grau de narcisismo, mais serão os posts, atualizações de status e hashtags glorificando o que somos ou queremos ser.
E será que o espelho não reflete justamente o contrário? Posso estar exagerando, mas o constante exibicionismo pode influenciar até na educação de adolescentes que podem se tornar adultos arrogantes, mimados e agressivos aos serem contrariados, desenvolvendo vícios, compulsões e outros distúrbios psicológicos. Em nossa geração, todo cuidado é pouco quando você diz a um jovem que ele é especial – ele realmente pode acreditar que é melhor do que os outros.
Percebo gente cada vez mais insegura e distante de relações interpessoais significativas. Por medo de serem irrelevantes, desinteressantes ou esquecidas, buscam mecanismos de compensação por meio da aprovação dos outros. Porém, quanto mais inconveniente essa pessoa se torna ao exigir afeto demasiado, mais evitada será, gerando um efeito rebote onde aceitação vira rejeição social.
Qual é o objetivo imposto? O de compartilhar de maneira prudente a sua história, ou de usar a internet como vitrine para garantir aceitação de um grupo de pessoas? E será que filtros, bordas e imagens do pôr do sol conseguem traduzir a vulnerabilidade e autenticidade de cada individuo ou criam um ambiente de pessoas obsessivas com a própria aparência e problemas, tornando-as mais egoístas, pasteurizadas e distantes de entenderem os próprios sentimentos e os dos outros que as cercam?
Tenho certeza de que muitas pessoas são a antítese disso. O perigo é quando a vaidade alimenta o ego, mas arrota narcisismo extremo. James Franco define as selfies como “uma nova maneira de olhar alguém nos olhos e dizer: “Olá, este(a) sou eu”, colocando em pauta a discussão sobre novas formas de comunicação na Web e como isso afeta, para bem e para o mal, a vida real e as experiências humanas.