Fazer amor é fundir o corpo e a alma. Fazer amor é unir o sagrado e o profano. Fazer amor é vivenciar o êxtase da impossibilidade. É o encontro perfeito de dois seres, entre tantos nesse mundo, que se amam e se desejam no mesmo tempo e espaço. Fazer amor é desafiar as leis da probabilidade. Amar e desejar alguém são processos distintos, complexos e cheios de variáveis. Às vezes, um detalhe que parece sem importância estraga tudo. “Ele não gostava de manga” ou “Ela tinha uma pintinha estranha no tornozelo”. Juntar amor e desejo é encontrar o pote de ouro no fim do arco-íris.
Como disse o escritor francês Roland Barthes, são precisos “muitos acasos, muitas coincidências surpreendentes e talvez muita procura para encontrar a imagem que convém ao desejo” e ainda se encaixa no coração. São as dificuldades de montar esse quebra-cabeças de tantas peças que tornam fazer amor um momento tão raro e sublime.
Apesar de reconhecer a beleza do ato, confesso que nunca gostei da expressão “fazer amor”. Sempre associei essa combinação de palavras a um papai-mamãe insosso. Uma escolha linguística de tiozões, casais quadradinhos ou escritores de novela. Como uma mulher que se acha bem resolvida sexualmente, essa maneira de falar sempre soou para mim como um clichê demodê, um jeito brega de tratar de sexo, um corta tesão instantâneo. Para os meus parâmetros de neofeminista, sexo gostoso é aquele que envolve uma boa dose de volúpia, o que nunca pareceu combinar com um convite que começasse com “vamos fazer amor”. Uma boa trepada, uma metida gostosa, um sexo selvagem ou até um fight sempre tiveram para mim pronúncias muito mais excitantes.
O problema é que a expressão ficou desgastada por causa do uso inadequado. Fazer amor virou eufemismo para o sexo nas telas do cinema e na vida real, quando deveria ser mais uma hipérbole. Fazer amor tornou-se um lugar comum e perdeu sua força semântica. Muitos profanaram a expressão dizendo que queriam fazer amor quando não desejavam nada além de uma relação sexual pura e simples, bem distante de qualquer sentimento. Para inventar um romantismo que não existe ou não assustar as mulheres mais recatadas, às vezes os homens lançam mão desse conjunto de palavras, sem pensar ou acreditar no seu significado. Por outro lado, estou com vontade de fazer amor soa mais doce na boca das mulheres do que quero trepar.
Mas usar a expressão fazer amor em vão é praticamente uma heresia. Só devemos empregá-la quando realmente existir amor no sexo. Quando isso acontece, o coração pulsa em sintonia com o tesão. Os braços envolvem o corpo e a alma. A pele conduz amor e desejo simultaneamente. Tudo o que sou une-se ao que você é em um encontro perfeito.
Clichê é algo que se repete. Em seu significado original, é um molde metálico usado na indústria gráfica. E fazer amor é algo tão raro que não pode ser clichê. Meu preconceito se formou com relação à expressão, e não ao ato, à banalização e à distorção dessas palavras tão fortes em significado. Ser capaz de fazer amor, tornar palpável um sentimento tão subjetivo, é divino.
“Encontro pela vida milhões de corpos; desses milhões posso desejar centenas; mas dessas centenas amo apenas um”. Para a maioria das pessoas, tirando os adeptos do poliamor, essa outra frase de Roland Barthes ajuda a traduzir o caráter especial do amor. Por essa razão, fazer amor passa longe do clichê. Fazer amor é um momento raro, é um privilégio para poucos. É quando o amor e o desejo entram na mesma órbita. Olhe para o céu e não confunda um meteorito com um asteroide.